As novas rendas depois do Pacote Mais Habitação

As novas rendas depois do Pacote Mais Habitação

Um limite inédito e que tantas dores de cabeça tem gerado.

Nunca como agora os problemas de habitação foram tão evidentes em Portugal. Com a compra dificultada (ou mesmo impossibilitada) pela subida das taxas de juro e o agravamento das condições de vida das famílias, o mercado de arrendamento também não se tem revelado uma opção mais viável de um ponto de vista financeiro.

Como funciona, então, este limite à renda inicial?

Uma das regras mais surpreendentes imposta por este diploma foi o do limite à renda inicial dos novos contratos de arrendamento. Até agora inédito, passa agora a estar previsto que as novas rendas não podem exceder em mais de 2% a última renda em vigor no último contrato de arrendamento. Naturalmente, esta informação originou um pânico junto dos senhorios, mas…calma, talvez o alarme tenha soado alto demais.

Em primeiro lugar, o limite não se aplica a todo e qualquer imóvel, mas apenas àqueles que tenham estado arrendados com contratos celebrados entre 08/10/2018 e 07/10/2023, ou seja, nos 5 anos anteriores à entrada em vigor do decreto-lei. Ou seja, se tem, por exemplo, um contrato iniciado em 2016, que agora termina, no próximo contrato para o mesmo imóvel não terá de cumprir qualquer limite de renda.

Por outro lado, o limite aplica–se também apenas aos imóveis cuja última renda em vigor seja superior aos limites estabelecidos na portaria 176/2019, de 6 de junho. Por exemplo, um T2 em Leiria tem como limite previsto naquela tabela 535€.

Vamos, então, a exemplos práticos

  • T2, em Leiria, arrendado desde 2020, com uma renda de 400€ e termina em Março de 2024, sendo 400€ a renda em vigor. Apesar de ter sido celebrado nos 5 anos anteriores à entrada em vigor da lei, a última renda em vigor é inferior à tabela prevista na Portaria do arrendamento acessível, pelo que o próximo contrato de arrendamento não está sujeito a qualquer limite à renda inicial;

  • T2, em Leiria, arrendado desde 2017, com uma renda de 800€, sendo essa a última renda em vigor. Apesar de a renda em vigor ser superior ao limite previsto no tabela, o contrato anterior foi celebrado mais do que 5 anos antes da entrada em vigor do DL n.º 56/2023, de 6 de Outubro e, por isso, não será aplicado qualquer limite à renda inicial do contrato de arrendamento seguinte;

  • T2, em Leiria, arrendado desde 2022, com uma renda de 900€. Sendo a última renda em vigor superior ao previsto na tabela da Portaria e tendo o último contrato sido celebrado nos 5 anos anteriores à entrada em vigor do decreto-lei, o próximo contrato terá como limite 2% acima do valor da última renda em vigor.

Mas…mesmo neste último caso, o limite não é necessariamente de 2%. Se tivesse sido possível atualizar a renda no contrato cessante e não o tivessem feito, podem os coeficientes não aplicados sê-lo agora, juntamente com os 2%. Exemplo: Contrato celebrado em 01 fevereiro de 2021, com uma renda de 1000€, que nunca foi atualizada. O contrato cessou em 31/01/2024. Neste caso poderemos aplicar os coeficientes de 2022, 2023 e 2024, acrescendo ainda os 2% do limite inicial, ou seja: 1000€ * 1,0043 * 1,0543 * 1,0694 * 1,02 = 1154,96€ ao invés dos expectáveis 1020€ (1000€ + 2%)

(Neste caso em específico, não estamos a aplicar os coeficientes a um contrato em vigor, mas sim a utilizá-los para calcular a renda inicial de um novo contrato. Por isto mesmo é que o coeficiente a contabilizar para 2023 é de 1,0543 e não de 1,02).

E em caso de incumprimento?

Certamente estarão a questionar-se: “o que acontece se estes limites não forem cumpridos?” e essa é uma excelente pergunta, à qual o diploma legal não deixou qualquer resposta. Na verdade, não está prevista qualquer contraordenação, nem tão pouco uma entidade fiscalizadora, sendo que, tecnicamente, a única entidade com informação suficiente para o efeito é a Autoridade Tributária.

Esta é mais uma das medidas que ficará na memória dos senhorios, mas que certamente não surtiu o efeito pretendido, uma vez que o processo legislativo demorou meses a desenrolar-se e, sendo esta regra de limitação de novas rendas parte da proposta inicial (de conhecimento público), o receio dos proprietários conduziu a uma escalada nas rendas iniciais, que no Porto e em Lisboa rondou os 30% quando comparado com o ano anterior.

25 de fevereiro de 2024

Rafael Parreira | Managing Partner da P&A Solicitadores SP RL
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