O mítico combate de alugar contra arrendar.
Nunca como agora os problemas de habitação foram tão evidentes em Portugal. Com a compra dificultada (ou mesmo impossibilitada) pela subida das taxas de juro e o agravamento das condições de vida das famílias, o mercado de arrendamento também não se tem revelado uma opção mais viável de um ponto de vista financeiro.
O arrendamento é das áreas com maior instabilidade legislativa, criando uma sensação de total insegurança para senhorios e arrendatários. Depois de meses de discussão sobre o tão anunciado Pacote Mais Habitação (um pacote legislativo da iniciativa do Partido Socialista), o diploma mais relevante acabou mesmo por ser publicado, no dia 06/10/2023, o DL n.º 56/2023, entrando em vigor no dia seguinte.
Uma das regras mais surpreendente imposta por este diploma foi o do limite à renda inicial dos novos contratos de arrendamento. Até agora inédito, passa agora a estar previsto que as novas rendas não podem exceder em mais de 2% a última renda em vigor no último contrato de arrendamento. Naturalmente, esta informação originou um pânico junto dos senhorios, mas…calma, talvez o alarme tenha soado alto demais.
Em primeiro lugar, o limite não se aplica a todo e qualquer imóvel, mas apenas àqueles que tenham estado arrendados com contratos celebrados entre 08/10/2018 e 07/10/2023, ou seja, nos 5 anos anteriores à entrada em vigor do decreto-lei. Ou seja, se tem, por exemplo, um contrato iniciado em 2016, que agora termina, no próximo contrato para o mesmo imóvel não terá de cumprir qualquer limite de renda.
Por outro lado, o limite aplica–se também apenas aos imóveis cuja última renda em vigor seja superior aos limites estabelecidos na portaria 176/2019, de 6 de junho. Por exemplo, um T2 em Leiria tem como limite previsto naquela tabela 535€.
Vamos, então, a exemplos práticos
- T2, em Leiria, arrendado desde 2020, com uma renda de 400€ e termina em Março de 2024, sendo 400€ a renda em vigor. Apesar de ter sido celebrado nos 5 anos anteriores à entrada em vigor da lei, a última renda em vigor é inferior à tabela prevista na Portaria do arrendamento acessível, pelo que o próximo contrato de arrendamento não está sujeito a qualquer limite à renda inicial;
- T2, em Leiria, arrendado desde 2017, com uma renda de 800€, sendo essa a última renda em vigor. Apesar de a renda em vigor ser superior ao limite previsto no tabela, o contrato anterior foi celebrado mais do que 5 anos antes da entrada em vigor do DL n.º 56/2023, de 6 de Outubro e, por isso, não será aplicado qualquer limite à renda inicial do contrato de arrendamento seguinte;
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T2, em Leiria, arrendado desde 2022, com uma renda de 900€. Sendo a última renda em vigor superior ao previsto na tabela da Portaria e tendo o último contrato sido celebrado nos 5 anos anteriores à entrada em vigor do decreto-lei, o próximo contrato terá como limite 2% acima do valor da última renda em vigor.
Mas…mesmo neste último caso, o limite não é necessariamente de 2%. Se tivesse sido possível atualizar a renda no contrato cessante e não o tivessem feito, podem os coeficientes não aplicados sê-lo agora, juntamente com os 2%. Exemplo:
Numa conversa de rua, estas terminologias podem confundir-se, mesmo sem perceção do próprio orador. No entanto, é questionável quando surge associado aos ditos outdoors ou outros meios de publicidade, por exemplo, com a seguinte mensagem “aluga-se T2”.
Pressupondo que um profissional que opere neste mercado necessita de, pelo menos, o mínimo de literacia imobiliária, estaremos então perante um erro básico, e como tal, poderá ter impactos negativos para os mesmos.
Poderá existir uma perda de confiança dos clientes, ou seja, quando um cliente contrata um agente imobiliário, este necessita que lhe prestem informações corretas e viáveis. Todavia, a disponibilização de informação incorreta poderá criar no cliente um desconforto, originando desconfiança, o que neste mercado não é bom…
Uma outra consequência que advém da utilização de erros básicos, como o que estamos aqui a relatar, é a reputação profissional, isto é, se um determinado sujeito é conhecido por cometer erros de principiante, mesmo que o seja, poderá afetar negativamente a sua capacidade de atrair e/ou reter clientes futuramente.
Certamente nenhum potencial arrendatário dirá “recuso-me a viver nesta habitação porque não é alugar que se diz”, mas estou igualmente certo de que muitos são os casos em que alguém já terá dito “como é possível cometer um erro tão simples e ainda por cima mandar fazer placas gigantescas com esse erro?”. Valerá mesmo a pena não corrigir?
Conclusão
Após uma investigação, não consegui concluir porque o povo utiliza, de forma errada, estas duas palavras. Por norma, o aluguer é utilizado para ambos os casos. Mas deixo-vos uma sugestão. Se vão “alugar” uma casa ou estão numa casa “alugada”, porque recebem ou pagam uma renda e não um aluguer? É com esta simples questão que consigo incutir, ainda que por breves momentos, a distinção entre estes dois conceitos.
Deste modo, podemos concluir que alugar uma casa ou uma divisão da mesma é errado. Contudo, não partam para a violência a tentar explicar o conceito, em vez disso, recorram a este textinho, com pouco mais de seiscentas e trinta palavras.